Crônica
A crônica é um gênero textual que tem como objetivo narrar fatos do cotidiano com humor e ironia, suscitando reflexão. A crônica é escrita em linguagem de "dia de semana" como diz Guimarães Rosa e intretém crianças, jovens e adultos. No Brasil temos muitos bons cronistas que já publicaram livros e/ou escrevem semanalmente em colunas de jornais e revistas, entre eles temos: Stanislaw Ponte Preta, Martha Medeiros, Luis Fernando Veríssimo, Rubem Braga, João Ubaldo Ribeiro, Millôr Fernandes, etc.
Luís Fernando Veríssimo
Meu autor preferido de cônicas é Luis Fernando Veríssimo, filho do também escritor Érico Veríssimo. O livro "Comédias da vida privada" reúne um arsenal de boas histórias cotidianas que eu ainda não fui capaz de encontrar em outro livro. É para rir do início ao fim. Vou agora compartilhar com vocês algumas.
APRENDA A CHAMAR A POLÍCIA
Eu tenho o sono muito leve, e numa noite dessas notei que havia alguém andando
sorrateiramente no quintal de casa. Levantei em silêncio e fiquei acompanhando os
leves ruídos que vinham lá de fora, até ver uma silhueta passando pela janela do
banheiro. Como minha casa era muito segura, com grades nas janelas e trancas
internas nas portas, não fiquei muito preocupado, mas era claro que eu não ia
deixar um ladrão ali, espiando tranquilamente.
Liguei baixinho para a polícia, informei a situação e o meu endereço.
Perguntaram-me se o ladrão estava armado ou se já estava no interior da casa.
Esclareci que não e disseram-me que não havia nenhuma viatura por perto para ajudar, mas que iriam mandar alguém assim que fosse possível.
m minuto depois, liguei de novo e disse com a voz calma:
— Oi, eu liguei há pouco porque tinha alguém no meu quintal. Não precisa mais ter
pressa. Eu já matei o ladrão com um tiro da escopeta calibre 12, que tenho guardada
em casa para estas situações. O tiro fez um estrago danado no cara!
Passados menos de três minutos, estavam na minha rua cinco carros da polícia,
um helicóptero, uma unidade do resgate , uma equipe de TV e a turma dos direitos
humanos, que não perderiam isso por nada neste mundo.
Eles prenderam o ladrão em flagrante, que ficava olhando tudo com cara de
assombrado. Talvez ele estivesse pensando que aquela era a casa do Comandante
da Polícia.
No meio do tumulto, um tenente se aproximou de mim e disse:
— Pensei que tivesse dito que tinha matado o ladrão.
Eu respondi:
— Pensei que tivesse dito que não havia ninguém disponível.
Nessa crônica o humor aparece quando constatamos que a polícia só está disponível quando um crime já foi cometido e não quando poderia prevenir um crime.
PAI NÃO ENTENDE NADA
- Um biquini novo?
- É,pai.
- Você comprou um no ano passado!
- Não serve mais, pai. Eu cresci.
- Como não serve? No ano passado você tinha 14 anos, este ano tem 15.
Não cresceu tanto assim.
Não cresceu tanto assim.
- Não serve, pai.
- Está bem, está bem. Toma o dinheiro. Compra um biquini maior.
- Maior não, pai. Menor.
Aquele pai, também, não entendia nada.
Nessa crônica o humor está em que quanto mais velha fica a adolescente menor é o biquíni que ela usa. O biquíni não serve por estar pequeno, não serve por estar grande e fora de moda.
O HOMEM TROCADO
O homem acorda da anestesia e olha em volta. Ainda está na sala de recuperação.
Há uma enfermeira do seu lado. Ele pergunta se foi tudo bem.
Há uma enfermeira do seu lado. Ele pergunta se foi tudo bem.
- Tudo perfeito - diz a enfermeira, sorrindo.
- Eu estava com medo desta operação...
- Por quê? Não havia risco nenhum.
- Comigo, sempre há risco. Minha vida tem sido uma série de enganos...
E conta que os enganos começaram com seu nascimento. Houve uma troca de
bebês no berçário e ele foi criado até os dez anos por um casal de orientais, que
nunca entenderam o fato de terem um filho claro com olhos redondos. Descoberto o
erro, ele fora viver com seus verdadeiros pais. Ou com sua verdadeira mãe, pois o
pai abandonara a mulher depois que esta não soubera explicar o nascimento de um
bebê chinês.
bebês no berçário e ele foi criado até os dez anos por um casal de orientais, que
nunca entenderam o fato de terem um filho claro com olhos redondos. Descoberto o
erro, ele fora viver com seus verdadeiros pais. Ou com sua verdadeira mãe, pois o
pai abandonara a mulher depois que esta não soubera explicar o nascimento de um
bebê chinês.
- E o meu nome? Outro engano.
- Seu nome não é Lírio?
- Era para ser Lauro. Se enganaram no cartório e...
Os enganos se sucediam. Na escola, vivia recebendo castigo pelo que não fazia. Fiz
era o vestibular com sucesso, mas não conseguira entrar na universidade. O computador
se enganara, seu nome não apareceu na lista.
era o vestibular com sucesso, mas não conseguira entrar na universidade. O computador
se enganara, seu nome não apareceu na lista.
- Há anos que a minha conta do telefone vem com cifras incríveis. No mês passado
tive que pagar mais de R$ 3 mil.
tive que pagar mais de R$ 3 mil.
- O senhor não faz chamadas interurbanas?
- Eu não tenho telefone!
Conhecera sua mulher por engano. Ela o confundira com outro. Não foram felizes.
- Por quê?
- Ela me enganava.
Fora preso por engano. Várias vezes. Recebia intimações para pagar dívidas que
não fazia. Até tivera uma breve, louca alegria, quando ouvira o médico dizer:
não fazia. Até tivera uma breve, louca alegria, quando ouvira o médico dizer:
- O senhor está desenganado.
Mas também fora um engano do médico. Não era tão grave assim. Uma simples
apendicite.
apendicite.
- Se você diz que a operação foi bem...
A enfermeira parou de sorrir.
- Apendicite? - perguntou, hesitante.
- É. A operação era para tirar o apêndice.
- Não era para trocar de sexo?
O humor está no fato de o homem contar todas as desventuras pelas quais já passou graças à sua falta de sorte para, ao fim da narrativa, descobrir que acaba de sofrer o pior de todos os enganos.
VERÍSSIMO, Luis Fernando. Comédias da vida privada: 101 crônicas escolhidas. Porto Alegre: L&PM, 1995.
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Agora é a sua vez
A atividade é livre. Selecione uma cônica que você goste, poste o nome do texto e o autor, diga por quê escolheu esse texto e analise a construção do humor na crônica escolhida.
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